A função social da escola

"No artigo, Mendonça traz diversos aspectos da sociedade em relação a educação,
e o contexto pedagógico vivido diariamente pelo aluno."

                                                         Ida Regina Moro Milleo de Mendonça
         O professor pensa ensinar o que sabe, o que recolheu dos livros e da vida. Mas o aluno aprende do professor
     não necessariamente o que o outro quer ensinar, mas aquilo que quer aprender. Assim, o aluno pode aprender o
   avesso ou o diferente do que o professor quer ensinar. Ou aquilo que o mestre nem sabe que ensinou, mas o aluno
   reteve. O professor, por isso, ensina também o que não quer, algo de que não se dá conta e passa silenciosamente
                                                                                                  pelas paredes da sala.
                                                                                                Afonso Romano de Sant’AnnaN
         Nossa intenção, neste capítulo, é promover uma reflexão crítica sobre a função social da escola,
         à luz das idéias e das concepções desenvolvidas e discutidas ao longo do texto que apresentaremos. Analisar e discutir a função e o papel que a escola ocupa na sociedade contemporânea não
é tarefa muito fácil, mas, aviso de antemão, é fascinante. É comum alunos saírem das universidades
e, ao iniciar suas atividades de docência, perceber o grande distanciamento entre as expectativas da
sociedade e a função da escola que nela está inserida.
       Proponho que deixemos de lado preconceitos ou conceitos cristalizados para, juntos, chegar-
mos ao final deste capítulo com uma concepção mais clara e coerente da função social da escola como
instituição específica de educação.
       De acordo com Gomes (2000), a educação nas sociedades primitivas acontecia, de modo geral,
por meio da socialização em atividades cotidianas, entre os membros das gerações mais novas e os
próprios adultos da comunidade.
       Todavia com as mudanças ocorridas na sociedade, seguidas de uma diversificação de funções e tarefas, essa forma
       de educação torna-se ineficiente. Isso significa que as demandas de interesses e necessidades de uma sociedade mais
       povoada e complexa não comportavam uma educação direta das novas gerações nas células primárias de convivência: a família, o grupo de iguais, os centros ou grupos de trabalho e produção. (Gomes, 2000, p. 13)
       Surgem então novas formas de se efetivar o processo educacional de crianças e de jovens, por
exemplo: a tutoria, o preceptor, as academias etc. Essas maneiras de educar as novas gerações ante-
cedem o contexto da sociedade contemporânea, na qual a forma predominante de educação tem sido
a escolar.
       No entanto, alerta-nos Delval (2001) que, apesar das significativas mudanças ocorridas ao longo
da história da humanidade – a vida social, a organização política, o trabalho – a prática no contexto
escolar continua reproduzindo um modelo de educação semelhante ao de tempos remotos.
       Então, nos tempos atuais, qual é a função social da escola?
       Segundo Dürkheim (1972), “quando se estuda historicamente a maneira de se formarem e desenvolverem os sistemas de educação, percebe-se que eles dependem da religião, da organização
política, do grau de desenvolvimento das ciências, do Estado, das indústrias etc. Separados de todos
essas causas históricas, tornam-se incompreensíveis”.
        Na visão de Gomes (2000), a função social da escola é desenvolver o pro-
  cesso de socialização do aluno e, nessa perspectiva, são dois os objetivos prioritários desse processo:
               incorporação do aluno no mundo do trabalho;
               a formação do cidadão para intervenção na vida pública.
        Segundo o referido autor, “a função da escola concebida como instituição
  especificamente configurada para desenvolver o processo de socialização das novas
  gerações, aparece puramente conservadora; garantir a reprodução social e cultural
  como requisito para a sobrevivência mesma da sociedade” (GOMES, 2000, p. 14).
        Desse modo, é por meio do currículo, da organização pedagógica, bem
  como dos próprios conteúdos, que a escola gradativamente repassa as idéias, os
  conhecimentos, os valores e as formas de conduta que a sociedade exige.
        Assim, sendo a escola concebida pela sociedade contemporânea como uma
  das instituições sociais responsáveis pela educação das novas gerações, encontra-se no meio de conflitos e contradições de idéias, valores e atitudes conservadoras
  e de mudança. Vale ressaltar que esses conflitos estão imbuídos na própria dinâmica de manutenção da nossa sociedade.
        Muitas vezes, ouvimos de professores, bem como de pessoas relacionadas
  a outros segmentos da sociedade, que a escola está despreparada para atender às
  exigências das demandas sociais.
        Embora essa premissa seja real, podemos visualizar que, nos últimos anos,
  há um movimento de mudança no sentido de transformação das funções e do
  papel da escola.
        A reflexão crítica sobre as práticas educativas tem sido fórum permanente
  de debates, dentro do contexto escolar, em congressos, seminários e encontros de
  semana pedagógica.
        De acordo com Gomes (2000), retomando os objetivos fundamentais do
  processo de socialização dos alunos na escola, temos que a sociedade contemporânea e, de certo modo industrial, exige que a escola tenha como meta primordial
  a preparação do aluno para o mercado de trabalho. Ou seja, o desenvolvimento das
  novas gerações referente a idéias, conhecimentos, habilidades e comportamentos
  precisa estar em consonância com as exigências da coletividade, das empresas,
  dos negócios e dos serviços.
        Quanto à socialização voltada para o desenvolvimento da cidadania e a preparação para a vida pública, a escola também vivencia dilemas marcados pela
  demanda social. Ao mesmo tempo que todas as pessoas têm os mesmos direitos
  como cidadãos, no campo econômico esse princípio não se mantém. Considera-se a propriedade e não o indivíduo como cidadão de direitos.
        Contrariando concepções conservadoras impostas pela sociedade, de que forma
  a escola pode assumir seu compromisso fundamental de socialização dos alunos?
        A escola, como espaço privilegiado de educação, deve assumir seu papel
  garantindo o desenvolvimento de idéias, de atitudes e de conhecimentos que
proporcionem ao aluno, “sua incorporação eficaz no mundo civil, no âmbito da liberdade de consumo, da liberdade de escolha e participação política, da liberdade
e responsabilidade na esfera da vida familiar e pública” (GOMES, 2000, p. 15).
      Nesse caminho, o colombiano Bernardo Toro (2002, p. 25) elaborou os códigos da modernidade que são, ao todo, sete competências para a escola desenvolver
no processo educacional dos alunos. São elas:
      1)    domínio da leitura e da escrita;
      2)    capacidade de fazer cálculos e resolver problemas;
      3)    capacidade de analisar, sintetizar e interpretar dados, fatos e situações;
      4)    capacidade de compreender e atuar em seu entorno social;
      5)    receber criticamente os meios de comunicação;
      6)    capacidade de localizar, acessar e usar melhor a informação acumulada;
      7)    capacidade de planejar, trabalhar e decidir em grupo.
      Sem a pretensão de supervalorizar as funções da escola, temos que a ação
educativa dela deve estar direcionada à promoção da consciência da realidade
humana.
      Nesse sentido, entendemos que educação pode ser definida como uma forma de compreender, de interpretar e de transformar o mundo.
      a educação tem variado infinitamente com o tempo e com o meio. Nas cidades gregas e la-
      tinas a educação conduzia o indivíduo a subordinar-se cegamente à coletividade [...]. Hoje
      esforça-se em fazer dele uma personalidade autônoma. Em Atenas, procurava-se formar
      espíritos delicados, prudentes, sutis [...], capazes de gozar o belo e os prazeres da pura
      especulação; em Roma, desejava-se especialmente que as crianças se tornassem homens
      de ação, apaixonados pela glória militar, [...]; na Idade Média a educação era cristã, antes
      de tudo; na Renascença toma caráter mais leigo, mais literário; nos dias de hoje, a ciência
      tende a ocupar o lugar que a arte outrora preenchia. Na verdade, [...] cada sociedade considerada em momento histórico determinado do seu desenvolvimento, possui um sistema
      de educação que se impõe aos indivíduos [...]. (DURKHEIM, 1972, p. 35-36)
      É preciso considerar que vivemos hoje em uma sociedade em mudança,
pluralista, portanto não podemos estabelecer um conceito unívoco de educação.
Podemos, sim, buscar compreendê-la como processo de vida social e individual.
      Em síntese, a ação educativa da escola, ao promover uma consciência da
realidade humana e social, proporciona ao aluno uma visão mais reflexiva e crítica
da sociedade.
             É papel da escola, como instrumento de educação formal, refletir sobre
          as demandas da sociedade marcadas pelo momento histórico e sua função nesse contexto.
             Não cabe à escola uma ação educativa que reproduza os valores econômicos e sociais dominantes. É função social da escola preparar os alunos para que, na convivência com tais valores, possa percebê-los, refletir
          e redimensioná-los de acordo com suas reais proporções e repercussões.

      É de fundamental importância que a escola em sua atividade cotidiana
  observe, ouça, perceba e identifique as idéias, os conhecimentos, as atitudes, os valores e a cultura de sua população. Pois é dessa maneira, que
  ela poderá proporcionar a seus alunos, pais e comunidade conduzir seu
  próprio processo educativo.
      Entendemos que a escola possui outras funções distintas das que citamos
neste capítulo. Uma delas é o “currículo oculto”, ou seja, tudo aquilo que não
está explicitado de forma intencional no desenvolvimento da proposta educativa
realizada pela escola. Todavia, é vivenciado pelo aluno na dinâmica das relações
interpessoais (professor-aluno e aluno-aluno), bem como no desempenho do trabalho pedagógico realizado diariamente no contexto escolar.
      É na vivência coletiva travada dentro do espaço escolar que o aluno poderá
perceber e tomar consciência a respeito de si mesmo,dos seus parceiros, das afinidades e amizades que podem ser construídas e, sobretudo, da necessária disciplina em termos de horários, hábitos de estudo e realização de tarefas.
      Enfim, é no convívio diário da escola, que o aluno poderá gradativamente
conhecer a si mesmo, o outro, e construir sua auto-imagem e identidade de sujeito
social.
Geovane Fernandes.(1ª)

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